Neste artigo, traduzido por um colaborador que preferiu não se identificar, Peter Kreeft apresenta um argumento clássico em favor da divindade de Cristo. Algumas vezes, ele é chamado de trilema de Lewis, visto que foi popularizado por C.S. Lewis em seu livro Cristianismo Puro e Simples (Editora Martins Fontes).
O argumento parte do pressuposto que Jesus afirmou explícita ou implicitamente ser Deus. Portanto uma das seguintes características deve ser atribuída a Cristo:
1. Lunático: Cristo não era Deus, mas ele pensou, de forma errônea, que era.
2. Mentiroso: Cristo não era Deus, e ele sabia, mas falou que era do mesmo jeito.
3. Senhor: Jesus é Deus.
Portanto, o argumento básico apóia-se em um dilema. Ou Jesus estava falando a verdade, ou não estava.
Este argumento pode ser útil para se refutar a concepção de que Jesus foi apenas um homem bom e sábio, mas não foi e não é Deus encarnado. A grande fraqueza do argumento é pressupor a confiabilidade histórica dos Evangelhos. Ou seja, ele não funciona com pessoas que não acreditam que os relatos dos Evangelhos sejam confiáveis.
Kreeft está bem ciente disto. Entretanto, o argumento que ele apresenta como resposta neste artigo é resumido e dificilmente convincente. Em resumo, ele alega que os judeus não ganharam nada com a invenção do Cristianismo, a não ser perseguição e morte. E, portanto, não teriam motivos para inventar tamanha mentira. Mas um cético sofisticado responderia que a idéia de que Jesus era divino não foi uma invenção deliberada, mas sim, um desenvolvimento gradual introduzido nas tradições sobre Jesus ao longo de décadas após a morte de Cristo.
Provavelmente Kreeft não ofereceu uma resposta mais completa para não tornar o artigo longo demais. De fato, para apresentar uma resposta mais completa, Kreeft já gastou metade de um livro chamado O Diálogo (Editora Mundo Cristão). Infelizmente esse livro está esgotado nas livrarias. De qualquer forma, um ótimo livro que pode servir de resposta aos questionamentos de um cético como citado acima é A Veracidade da Fé Cristã, escrito pelo Dr. William Lane Craig (Edições Vida Nova).
Wagner Kaba
A divindade de Cristo
Peter Kreeft
A doutrina da divindade de Cristo é a doutrina central do Cristianismo, é como uma chave mestra que abre todas as portas. Os cristãos não inferiram e testaram independentemente cada um dos ensinamentos de Cristo recebidos através da Bíblia e da Igreja, mas creram em todos eles baseados em sua autoridade. Como Cristo é Divino, ele pode ser confiado por ser infalível em tudo o que disse, até mesmo em coisas duras como exaltar o sofrimento e a pobreza, proibir o divórcio, dar a Sua Igreja autoridade para ensinar e perdoar pecados em Seu nome, avisar sobre o Inferno (freqüentemente e seriamente), instituir o escandaloso sacramento de comer Sua carne – freqüentemente nós nos esquecemos de quantas “coisas duras” Ele ensinou!
Quando os primeiros apologistas cristãos começaram a dar razões de fé para os incrédulos, a doutrina da divindade de Cristo naturalmente começou a ser contestada. Para os gentios essa doutrina era quase tão incrível, quanto escandalosa para os Judeus. A idéia de que um homem que nasceu do ventre de uma mulher e morreu numa cruz, um homem que ficou cansado e faminto e bravo e agitado e chorou no túmulo do seu amigo, um homem que tinha sujeira debaixo das unhas seja Deus, foi pura e simplesmente a idéia mais espantosa, incrível e louca que já entrou na mente do Homem em toda a história.
O argumento que os primeiros apologistas usaram para defender essa doutrina aparentemente indefensível, foi usado freqüentemente num livro que se tornou um clássico de C.S. Lewis – “Cristianismo Puro e Simples”, o livro que convenceu Chuck Colson (e milhares de outras pessoas). Uma vez eu gastei metade de um livro (O Diálogo) nesse argumento. É o argumento mais importante na apologética cristã, uma vez que, se um incrédulo aceita esse argumento (que Cristo é divino), tudo mais em relação à Fé decorre, não somente intelectualmente (os ensinamentos de Cristo são todos verdadeiros), mas também no comportamento do novo cristão (se Cristo é Deus, ele é também seu único e suficiente Senhor e Salvador).
O argumento, como todos os efetivos, é muito simples: Ou Cristo era Deus, ou um homem mal intencionado.
Incrédulos quase sempre dizem que ele era um bom homem, não um homem mal; que ele era um grande professor de moral, um filósofo, um moralista, um profeta, não um criminoso, não um homem que merecia ser crucificado. Mas a única coisa que Cristo não poderia ter sido, segundo o senso comum e a lógica, é um homem bom. Porque Ele alegou ser Deus. Ele disse, “Antes que Abraão fosse, eu Sou”, deste modo falando a palavra que nenhum Judeu ousa falar porque é o próprio nome particular de Deus, falada a Moises no arbusto que se queimava. Jesus queria que todos acreditassem que ele era Deus. Ele queria que todos O adorassem. Ele afirmou que podia perdoar todos os pecados de todos contra todos (Quem pode fazer isso além de Deus, o único ofendido em todos os pecados?)
Agora, o que nós pensaríamos de uma pessoa, andando por ai, fazendo essas afirmações nos dias de hoje? Certamente que ele não era um bom homem ou um sábio. Só existem duas possibilidades: ele fala a verdade, ou não. Se ele fala a verdade, ele é Deus e fim de papo. Nós devemos acreditar nele e adorá-lo. Se ele não fala a verdade, então ele não é Deus e sim um mero homem. Mas um mero homem que quer que você o adore como Deus, não é um bom homem. Ele é um homem muito mal intencionado, tanto moralmente, quanto intelectualmente. Se ele sabe que ele mesmo não é Deus, então ele é moralmente mal. Um mentiroso, que tenta deliberadamente levar-te a blasfêmia. Se ele não sabe que ele não é Deus, se ele sinceramente se acha Deus, então ele está mentalmente mal – na verdade, insano.
A medida da sua insanidade é a distância entre o que você pensa ser e o que você realmente é. Se eu penso que eu sou o maior filósofo da América, eu sou somente um tolo arrogante; se eu me considero Napoleão, eu estou louco; se eu acho que eu sou uma borboleta, eu estou plenamente encharcado dos raios solares da insanidade. Mas, se eu me considero Deus, então eu estou ainda mais insano! Porque a distância entre o que eu sou e Deus, a distância entre qualquer coisa finita e o infinito Deus é ainda maior do que a distância entre duas coisas finitas, maior até do que a distância entre um homem que se considera uma borboleta.
Josh McDowell resumiu o argumento simples e memoravelmente no trilema
“Deus, Mentiroso ou Lunático?”. Essas são as únicas opções. Bem, então por que não um mentiroso ou lunático? Porém, quase ninguém que já leu os Evangelhos pode honestamente ou seriamente considerar alguma dessas opções. A capacidade de atração por Jesus emerge dos Evangelhos com inevitável vigor para qualquer um, por mais endurecido e preconceituoso que seja o leitor. Compare Jesus com um mentiroso como o Reverendo Sun Myung Moon ou lunáticos como o falecido Nietzsche. Jesus tem em abundância essas três qualidades especificamente que faltam nos lunáticos e mentirosos:
1. Sua sabedoria prática, a habilidade de entender corações humanos e pessoas, ver as questões escondidas nas entrelinhas, e seu poder de curar o espírito das pessoas bem como seus corpos.
2. Seu profundo e conquistador amor, sua paixão e compaixão, sua habilidade por atrair pessoas e fazer com que elas se sintam em casa e perdoadas, sua autoridade “não como a dos escribas” sobre todas as coisas.
3. Sua capacidade de surpreender, sua imprevisibilidade e sua criatividade. Mentirosos e lunáticos são tão aborrecidos e previsíveis! Nenhum dos Evangelhos, nem os seres humanos podem acreditar que Jesus era um lunático ou um mentiroso, um homem mal.
Não, os incrédulos quase sempre acreditam que Jesus era um homem bom, um profeta, um sábio. Bem, então, se Ele era um sábio, você pode acreditar nele e confiar nas coisas essenciais que Ele fala. E a coisa essencial que Ele fala, é que Ele é o divino Salvador do mundo e que você deve ir até Ele para que possa ser salvo. Se Ele é um sábio, você deve aceitar seu ensino essencial como verdadeiro. Se o que Ele está ensinando é falso, então Ele não é um sábio.
A força desse argumento, é que não é um mero argumento lógico sobre conceitos; é sobre Jesus. O argumento convida as pessoas a ler os Evangelhos e a conhecer esse homem. A premissa do argumento é o caráter de Jesus, a natureza humana de Jesus. O argumento tem os seus pés na terra. Mas ele leva você para o céu, como a escada de Jacó (o que significou Jesus disse-lhe: Gn 28:12; Jo 1:51). Cada degrau seguinte detém o conjunto. O argumento é lógico; simplesmente não há como escapar.
Mas então, por que as pessoas freqüentemente confrontam esse argumento? Elas simplesmente confessam sua preconceitos: “Ah, eu não posso acreditar nisso!” (Mas se ele foi provado como verdadeiro, então você tem de crer nele, se você realmente busca pela verdade!)
Algumas vezes, essas pessoas vão embora, como muitos contemporâneos de Jesus, imaginando, balançando suas cabeças e pensando. Esse é, talvez, o melhor resultado que você pode esperar. O terreno foi preparado, a semente foi semeada, Deus fará ela crescer.
Mas se as pessoas conhecem alguma teologia moderna, elas podem ter uma ou duas saídas. A Teologia tem uma saída, o senso comum não. O senso comum é facilmente convertido, mas são os Teólogos, que são difíceis de converter.
A primeira saída é o ataque dos “acadêmicos” bíblicos sobre a confiabilidade histórica dos Evangelhos. Talvez Jesus nunca tenha dito ser divino. Talvez todas as passagens constrangedoras sejam invenções da Igreja primitiva (digamos “comunidade Cristã” — isto soa melhor).
Nesse caso, quem inventou o Cristianismo tradicional senão Cristo? Uma mentira, do mesmo modo que uma verdade, deve se originar em algum lugar. Pedro? Os doze? A próxima geração? Qual foi o motivo de quem quer que tenha inventado o mito (eufemismo para mentira)? Por que eles saíram com esta invenção blasfema e elaborada? Pois isto deve ter sido uma mentira planejada, não uma simples confusão. Nenhum judeu confunde o Criador com a criatura, ou Deus com o homem. E nenhum homem confunde um corpo morto, com um corpo que ressuscitou, um corpo que vive.
Aqui está o que eles conseguiram com a mentira. Seus amigos e famílias os desprezaram. Suas posições sociais, suas posses, seus privilégios políticos foram roubados deles por Judeus e Romanos. Eles foram perseguidos, aprisionados, torturados, exilados, despedaçados por leões, mortos por gladiadores.
Então alguns Judeus tolos inventaram toda a grande, elaborada e incrível mentira do Cristianismo por absolutamente nenhuma razão, e milhões de Gentios acreditaram nisso, devotaram suas vidas a isso, e morreram por isso — por nenhuma razão. Foi apenas uma fantástica brincadeira, uma mentira. Sim, aqui há uma mentira, mas quem a preparou foram os teólogos do século 20, não os escritores dos Evangelhos.
A segunda saída (note como somos ávidos para nos contorcer fora dos braços de Deus como porcos arredios) é Orientalizar Jesus, para interpretá-lo não como o único Deus-homem, mas como um de muitos místicos ou “adeptos” que descobriram suas próprias divindades interiores justo como um típico místico hindu faz. Essa teoria consegue amenizar sua afirmação de divindade, por que ele apenas percebeu que todo mundo é divino. O problema com esta teoria é simplesmente que Jesus não era um Hindu, mas, um Judeu! Quando ele disse “Deus”, nem ele, nem seus ouvintes pensaram em Brahma, o impessoal, panteísta, imanente em tudo; ele pensou em Yavé, o pessoal, teísta, transcendente Criador. É absolutamente anacrônico ver Jesus como um místico, um guru Judeu. Ele ensinou a oração, não a meditação. Seu Deus é uma pessoa, não um pudim. Ele ensinou pecado e perdão, como nenhum guru faz. Ele não disse nada sobre a “ilusão” da individualidade, como os místicos fazem.
Ataque cada uma dessas evasões – Jesus como o bom homem. Jesus como o mentiroso, Jesus como o lunático, Jesus como o homem que nunca alegou a divindade, Jesus como o místico. Tire essas casas fortes, e só sobrará uma única casa para o rei do incrédulo se mover. E nessa casa lhe aguarda o xeque-mate. E um alegre encontro se torna. O argumento inteiro é realmente um convite de casamento*.
(*) Nota do tradutor: O autor quis fazer um jogo de palavras entre as palavras mating, que pode significar acasalamento, e mate, de xeque-mate. Por isto, ele diz que “o argumento inteiro é realmente um convite de casamento”.
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