segunda-feira, 27 de julho de 2009

A FÉ IMPOSSÍVEL

Ou: Como não começar uma religião antiga.

Por: J.P. Holding – Tektonics.org

Sumário: Oferece 17 razões pelas quais o Cristianismo não poderia ter sobrevivido no mundo antigo, a menos que tivesse evidências indiscutíveis da ressurreição de Jesus.

[Esboço Geral] [A vergonha da crucificação] [Judaísmo e geografia] [Uma ressurreição física] [Novidade] [Ética] [Tolerância] [Tocando a história] [Mais do que mártires] [Humano X Divino] [Insultando as classes] [Mulheres como testemunhas] [Caipiras como testemunhas] [Metendo-se em assuntos alheios] [Uma divindade ignorante?] [Um profeta sem honra] [Miscelânea de contrários] [Convites para refutar]

[O autor deste artigo está atualmente escrevendo um livro com o mesmo nome. Todas as citações Bíblicas aqui são da NTLH, no artigo original as citações são da KJV. Traduzido e adaptado por Maximiliano Mendes.]

Ao longo dos anos, coletamos literalmente resmas de informações em defesa da fé cristã. Neste tempo, utilizamos e lidamos com numerosas fontes informando sobre o contexto social e literário do Novo Testamento. Agora chegou a hora de juntar os pedaços de algumas dessas fontes em uma defesa geral da fé. (Temos comentários sobre algumas reações a este artigo de certos caipiras locais no MetaFilter aqui.)

Adotamos o subtítulo Como não começar uma religião antiga. O contexto aqui é sobre certas acusações dos céticos, de que o Cristianismo foi um movimento nascido do ditado de que, nasce um besta a cada minuto, e o Cristianismo, em seu início, teve bestas “pra mais de ano”. Como prova, somos apontados para várias personalidades e/ou movimentos na história – Sabbatai Sevi, Zalmoxis ou Alex e Glycon (Glycon era uma serpente de estimação). Temos mostrado que cada um destes paralelos é inadequado, mas agora é a hora de organizar uma lista compreensível de tópicos que afirmamos que os críticos devem lidar quando forem explicar o motivo do Cristianismo ter sucedido onde certamente deveria ter falhado ou morrido como estes outros movimentos. Dizer meramente que foi por “sorte”, ao passo que Sevi et al., não, não será uma resposta adequada – e na verdade, como veremos, é a resposta menos provável.

Abaixo eu ofereço uma lista de 17 fatores a serem considerados – ocasiões onde o Cristianismo “fez a coisa errada” a fim de se tornar uma religião de sucesso. Eu alego que a única forma do Cristianismo ter tido sucesso é porque realmente é uma fé revelada – e porque tinha testemunhos irrefutáveis sobre a ressurreição. Eu posso adicionar mais fatores enquanto minha pesquisa continua. Por enquanto, isso deve ser o bastante para manter os céticos ocupados, se eles já não estiverem engajados em estudos buscando contradições numéricas entre 1 Reis e 1 Crônicas, ou escavando figuras pagãs obscuras e irrelevantes que vendiam óleo de cobra. Os leitores veteranos notarão que há poucas novidades relatadas neste artigo que já não possam ser encontradas em outros locais deste site; realmente, muito do que é mostrado abaixo foi literalmente tirado de outros artigos – só a aplicação que é nova.

FATOR 1 – QUEM IRIA CRER EM UM CRUCIFICADO?

1 Coríntios 1:18 - De fato, a mensagem da morte de Cristo na cruz é loucura para os que estão se perdendo; mas para nós, que estamos sendo salvos, é o poder de Deus.
1 Coríntios 15:12-19 - 12Se a nossa mensagem é que Cristo foi ressuscitado, como é que alguns de vocês dizem que os mortos não vão ressuscitar? 13Se não existe a ressurreição de mortos, então quer dizer que Cristo não foi ressuscitado. 14E, se Cristo não foi ressuscitado, nós não temos nada para anunciar, e vocês não têm nada para crer. 15E mais ainda: nesse caso estaríamos mentindo contra Deus, porque afirmamos que ele ressuscitou Cristo. Mas, se é verdade que os mortos não são ressuscitados, então Deus não ressuscitou Cristo. 16Porque, se os mortos não são ressuscitados, Cristo também não foi ressuscitado. 17E, se Cristo não foi ressuscitado, a fé que vocês têm é uma ilusão, e vocês continuam perdidos nos seus pecados. 18Se Cristo não ressuscitou, os que morreram crendo nele estão perdidos. 19Se a nossa esperança em Cristo só vale para esta vida, nós somos as pessoas mais infelizes deste mundo.

Com a exceção dos que crêem que Jesus nunca existiu (JNE) e os que crêem em teorias conspiratórias (e no que diz respeito a este assunto, eu incluo os muçulmanos neste grupo!), poucos negariam a realidade histórica da crucificação. Contudo, uma vez que a porta é aberta, ela traz o primeiro dos nossos problemas: Quem acreditaria em uma religião centrada em um homem que foi crucificado?

Como mostrado amplamente por Martin Hengel em sua monografia, Crucifixion [Crucificação], a vergonha da cruz era o resultado de uma norma fundamental do Império Greco-Romano. Hengel observa que “a crucificação era um caso absolutamente ofensivo, ‘obsceno’ no sentido original da palavra”. (22) Como Malina e Rohrbaugh notam em seu Social-Science Commentary on John [Comentário Sociológico de João] [263-4], a crucificação era um “ritual de degradação do status desenvolvido para humilhar de todas as formas possíveis, incluindo o simbolismo da encravação das mãos e pernas, significando a perda de poder, e perda da habilidade de controlar o corpo de várias formas, inclusive podendo se sujar com seus próprios excrementos. O processo era tão ofensivo que os Evangelhos oferecem as descrições mais detalhadas de uma crucificação nos tempos antigos – o assunto deixava os autores pagãos muito revoltados para oferecerem descrições igualmente compreensíveis – apesar do fato de que foram realizadas milhares de crucificações ao mesmo tempo, em algumas ocasiões. “(O) mundo literário culto não queria relacionar-se com [a crucificação], e como regra, manteve-se em silêncio a respeito disso” (38). Era sabido desde o tempo de Paulo (1 Coríntios 1:18; veja também Hebreus 12:2) que pregar sobre um salvador que sofreu as desgraças deste tratamento era tolice. E era assim tanto para os Judeus (Gálatas 3:13; Deuteronômio 21:23) quanto para os Gentios. Justino Mártir escreveu posteriormente em sua primeira Apologia 13:4 –

Eles dizem que nossa loucura consiste no fato de que nós colocamos um homem crucificado em segundo lugar, depois do Deus eterno e imutável…

Celso descreve Jesus como alguém “amarrado da forma mais ignominiosa” e “executado de forma vergonhosa”. Josefo descreve a crucificação como “a mais desprezível das mortes”. Um oráculo de Apolo preservado por Agostinho descrevia Jesus como “um deus que morreu em desilusões … executado no verdor dos anos pela pior das mortes, uma morte atada ao ferro” (4). E assim são as opiniões: Sêneca, Luciano, Pseudo-Manetho, Plautus. Mesmo as classes baixas se juntaram à maldade, como demonstrado por um grafite apresentando um homem suplicando diante de uma figura crucificada com a cabeça de um jumento, com o subtítulo: “Alexamenos adora a deus”. (A cabeça de jumento sendo um reconhecimento das raízes Judaicas do Cristianismo: Uma convenção da polêmica anti-Judaísmo era que os Judeus adoravam um jumento no templo deles. – 19) Embora confuso em outros assuntos, Walter Bauer afirmou corretamente (ibid.):

Os inimigos do Cristianismo sempre se referiam à desgraça da morte de Jesus com grande ênfase e prazer malicioso. Um deus ou o filho de deus em uma cruz! Aquilo era o bastante para liqüidar a nova religião.

E DeSilva adiciona [51]:

Nenhum membro da comunidade Judia ou a sociedade Greco-Romana adotaria a fé ou se juntaria ao movimento Cristão sem antes aceitar que a perspectiva de Deus sobre o tipo de comportamento que merece honra difere excessivamente da perspectiva dos seres humanos, visto que a mensagem sobre Jesus é a de que os líderes Judeus e Gentios de Jerusalém avaliaram Jesus, suas convicções e seus feitos como merecedores de uma morte vergonhosa, mas Deus subverteu a avaliação que eles tinham de Jesus ao ressuscitá-lo dos mortos e sentá-lo à sua direita [de Deus] como Senhor.

N.T. Wright também aponta isso em Resurrection of the Son of God [A Ressurreição do Filho de Deus – 543, 559,563]:

O argumento, neste ponto, procede em três estágios. (i) O Cristianismo primitivo foi sistematicamente messiânico, moldando-se sobre a crença de que Jesus era o Messias de Deus, o Messias de Israel. (ii) Mas a concepção de Messias no Judaísmo, da forma como era, nunca contemplou alguém fazendo o tipo de coisas que Jesus havia feito, sem falar no destino que ele teve. (iii) O historiador deve, portanto, perguntar por que os primeiros Cristãos reivindicavam essas coisas sobre Jesus, e por que reordenaram suas vidas de acordo com isso.

As crenças do Judaísmo sobre a vinda de um Messias, e sobre os feitos que se esperava que tal personalidade cumprisse, vieram em várias formas e tamanhos, mas não incluíam uma morte vergonhosa, que deixou o Império Romano celebrando a vitória de forma habitual.

Alguma coisa aconteceu com a crença sobre a vinda de um Messias … ela não foi nem abandonada, nem simplesmente reafirmada em grande extensão. Ela foi redefinida baseada em Jesus. Por quê? Os primeiros Cristãos respondiam a essa questão, é claro, com uma só voz: Nós cremos que Jesus era e é o Messias, pois ele ressuscitou dos mortos. Nada mais funcionaria aqui.

A mensagem da cruz era repulsiva, uma vulgaridade em seu contexto social. Discutir a crucificação era o pior tipo de faux pas [passo em falso – falta de etiqueta]; era relacionado, mas somente no sentido mais superficial, a discutir técnicas de recuperação de esgotos durante uma boa refeição – mas pior ainda quando em associação com um suposto deus ter vindo à terra. Hengel adiciona: “Um Messias crucificado … deve ter parecido com uma contradição de termos para qualquer um, Judeu, Grego, Romano ou bárbaro. Eles certamente julgariam tolo e ofensivo se alguém lhes perguntasse se acreditariam nisso. “Que um deus desceria ao reino da matéria para sofrer dessa forma tão ignominiosa” era contrário não somente ao pensamento político Romano, mas a todo o etos da religião dos tempos antigos, e em particular, às idéias sobre Deus que as pessoas educadas tinham” (10, 4). Anunciar um deus crucificado seria semelhante à Convenção Batista do Sul anunciar que passaria a sancionar a pedofilia! Se Jesus realmente era um deus, então de acordo com o pensamento Romano, a crucificação nunca deveria ter acontecido. Celso, um antigo crítico pagão do Cristianismo, escreve:

Mas se (Jesus) era tão grande, ele deveria, a fim de demonstrar sua divindade, ter desaparecido repentinamente da cruz.

Este comentário representa não somente o desafio de um cético, mas é um reflexo de uma consciência impregnada sócio-teologicamente. Os Romanos não podiam antever um deus morrendo como Jesus e ponto final. Assim como discutir sobre se o céu é verde, ou se os porcos voam, mas estes argumentos pelo menos não ofendiam as sensibilidades ao máximo. Precisamos enfatizar isto (pela primeira, mas não última vez) de uma perspectiva social, pois a nossa própria sociedade não é tão sintonizada quanto ao processo de honra quanto a sociedade antiga. Achamos estranho assistir Shogun e imaginar homens se suicidando pelo bem da honra. Os Judeus, Gregos e Romanos não achariam nada de estranho nisso. Como David deSilva mostra em Honor, Patronage, Kinship and Purity [Honra, Clientelismo, Afinidade e Pureza], o honorável era, para os antigos, de importância primordial. A honra era posta acima da própria segurança pessoal e era o elemento chave ao se decidir modos de ação. Isócrates dá conselhos pessoais baseado não no que era “certo ou errado”, mas sim no que era “nobre ou desonroso”. “A promessa da honra e a ameaça da desgraça [eram] estimulantes proeminentes quando se procurava certo tipo de vida e para evitar muitas alternativas” [24]. O Cristianismo, é claro, respondia que a morte de Jesus foi um ato honorável de sacrifício pelo bem alheio – mas esse tipo de lógica só funciona se você já estivesse convencido por outros meios!

Sendo este o caso, podemos perguntar de forma razoável pela primeira vez neste ensaio, por que o Cristianismo teve sucesso. A infâmia de um salvador crucificado era um impedimento tão grande para a fé cristã como é hoje em dia – de fato, era muito, muito mais! Por que, então, havia Cristãos? Na melhor das hipóteses este deveria ter sido um movimento com somente alguns seguidores estranhos, e então morrido dentro de algumas décadas como uma nota de rodapé, se sequer fosse mencionado. A realidade histórica da crucificação não poderia, é claro, ser negada. Para sobreviver, o Cristianismo ou teria de ter se tornado gnóstico (como realmente aconteceu em alguns desdobramentos), ou então não ter se incomodado com Jesus, e meramente ter feito dele o primeiro mártir de um ideal moral mais eminente dentro do Judaísmo. Teria sido absurdo sugerir, para um Judeu ou Gentio, que um ser crucificado era digno de adoração ou que morreu pelos nossos pecados.

Só pode haver uma única boa explicação: O Cristianismo teve sucesso pois da cruz veio a vitória, e após a morte veio a ressurreição! A vergonha da cruz converteu-se em uma das provas mais incontestáveis do Cristianismo!

FATOR 2 – NEM DAQUI NEM DE LÁ: OU, UM HOMEM DA GALILÉIA??

João 1:46 – Natanael perguntou: – E será que pode sair alguma coisa boa de Nazaré? – Venha ver! – respondeu Filipe.
Atos 21:39 – Paulo respondeu: – Eu sou judeu, nascido em Tarso, cidade muito importante da região da Cilícia. Por favor, me deixe falar com o povo.

A geografia oferece alguma vantagem para a religião? Para os antigos, “muito em todos os aspectos”! O politicamente correto estava a 2000 anos no futuro, e o mundo Greco-Romano era cheio do que nós chamamos de preconceitos e estereótipos – que eram aceitos como “Grandes Verdades”! Diga hoje em dia que “X são sempre brutos, gulosos e etc.” e você terá meia dúzia de grupos dos direitos civis batendo à sua porta. Diga isso em Roma e você verá todos concordando contigo – às vezes até mesmo o próprio grupo criticado!

Jesus ter sido Judeu é um fato que dificilmente poderia ter sido negado pelos primeiros Cristãos, mas também era um grande impedimento para se expandir o Evangelho além dos próprios Judeus. O Judaísmo era considerado como uma superstição pelos Romanos e Gentios. Escritores Romanos como Tácito relataram de forma entusiástica (não como verdade, mas algo como “alguns dizem…”) todos os tipos de calúnias contra os Judeus de forma geral, considerando-os uma raça malévola e detestável. Tentar trazer um salvador Judeu para a porta de um Romano normal teria menos sucesso do que tentar levar um à porta de um nazista – embora o Romano talvez não quisesse te matar; ele certamente iria rir da sua cara, bater a porta ou te dar um cascudo.

Isto é claro do próprio Judaísmo e suas limitadas incursões em termos de conversão de Gentios. Sem dúvidas, isto é parcialmente atribuível ao fato de que o Judaísmo não era uma religião muito missionária. E, contudo, se o Cristianismo não tivesse algumas cartas na manga, o fato de Jesus ser Judeu, por si só significa que ele nunca deveria ter se expandido no mundo dos Gentios muito além do círculo daqueles que já eram tementes a Deus (i.e., Gentios convertidos ao Judaísmo).

Vamos enfatizar novamente os pontos feitos por Robert Wilken em The Christians as the Romans Saw Them [Os Cristãos Como Vistos Pelos Romanos]. Os Romanos naturalmente consideravam suas crenças superiores às de todos os outros (57). Eles também acreditavam que superstições (como o Judaísmo e o Cristianismo) minavam o sistema social estabelecido pela religião Romana – e, é claro, eles estavam certos. Entretanto, o ponto é que qualquer um que seguisse ou adotasse uma das superstições estrangeiras seria visto não somente como um rebelde religioso, mas também como um rebelde social. Eles estavam quebrando o status quo, espalhando o caos, participando de uma rebelião estilo a dos anos de 1960 contra a elite dominante. Eles perturbavam o conceito Romano de devoção e acreditava-se que eram incapazes de ser devotos. Naqueles dias, as coisas não eram pluralísticas ou “politicamente corretas” e não havia campeões da diversidade em campi universitários: Hoje em dia, ateus e teístas podem debater em um foro aberto, mas naquele tempo um dos lados da disputa teria o Estado (e a espada!) ao seu lado – e no tempo em questão, não era o lado dos Cristãos!

Aqueles que aderiam à superstitio, portanto, encontravam-se obviamente associados com comportamentos estranhos e bizarros – como os Cristãos, e também os Judeus, como relatado por Tácito em sua obra Histórias. E ele foi ainda mais longe: “(C)omo a superstição leva a idéias irracionais sobre os deuses, a conseqüência inevitável é o ateísmo” (61). Visto que os “supersticionistas” avançaram contra a ordem cósmica estabelecida, sua visão de universo era considerada como volúvel e irracional, e isto eventualmente levou os críticos, a acusarem os Cristãos, como Crescens, de serem ateus (68).

Claro, isto é apenas um problema dentro da missão para converter os Gentios. Mas nesse caso, e mesmo dentro do Judaísmo, o Cristianismo teve de superar outro estigma, já exemplificado em nossas citações comparativas. Quando Paulo mencionava que era de Tarso, não fazia isso para comparar notas sobre cidades natais com o centurião. Ser de uma pólis grande como Tarso significava uma classificação de elevada honra para a pessoa que exigia direitos – isso pode ser marginalmente comparado com os nossos conceitos atuais sobre “morar na vizinhança certa”! O Cristianismo tinha um sério impedimento no que diz respeito a esse aspecto, o estigma de um salvador que inegavelmente procedia da Galiléia – para os Romanos e Gentios, não somente um território Judeu, mas uma estufa de sedição política; para os Judeus, não tão ruim como a Samaria, claro, mas era uma terra de caipiras e fazendeiros sem muito respeito pela Torá, e o pior de tudo, um salvador de um vilarejo pequeno e sem importância. Nem mesmo um nascimento em Belém, ou a sugestão de Mateus que uma origem na Galiléia foi profeticamente decretada, teriam desprendido tal estigma: Certamente os Judeus não se convenceriam disso, mesmo hoje em dia, a menos que algo primeiramente os convencesse de que Jesus era divino ou era o Messias. Assim como nós, os antigos não eram menos sensíveis à manipulação de informações.

Há outras extensões menores sobre esse negócio de estereótipos. Dar a Jesus o cargo de carpinteiro era a coisa errada a se fazer; Cícero notou que tais ocupações eram “vulgares” e comparadas ao trabalho dos escravos. Colocar a história do nascimento de Jesus em um contexto suspeito onde uma acusação de ilegitimidade seria óbvia demais também faria parte dos problemas. Se os Evangelhos estivessem inventando essas coisas, quão difícil seria colocar Jesus em Seforis ou Cafarnaum (e ainda tirar vantagem profética da “conexão Galiléia”) – e como os céticos estão acostumados a dizer, de forma errônea, isto não seria mais fácil ou difícil de checar do que Nazaré. Quão difícil seria adotar uma Cristologia “adocionista” e dar a Jesus um nascimento incontestavelmente honroso (ao invés de reivindicar honra pelo duvidoso, superficialmente, reivindicar que Deus era o pai de Jesus)? Talvez mais difícil, pois é pouco provável que as pessoas notem um só homem, em comparação a uma cidadezinha com fortes laços comunitários. Isso tudo significa que: A pessoa de Jesus estava errada em tudo o que diz respeito a fazer com que as pessoas acreditassem que ele era uma divindade – e deve ter sido algo realmente poderoso superar todos os estigmas.

FATOR 3 – FICANDO NA CARNE! O TIPO ERRADO DE “RESSURREIÇÃO”

Como já mostramos aqui, a ressurreição de Jesus dentro do contexto do Judaísmo foi vista pelos Gentios como o que pode ser descrito como “grosseiramente” física. Isto em si levanta um problema para o Cristianismo tornar-se algo mais do que uma missão básica do Judaísmo. Regularmente citamos o dito de Pheme Perkins: “Os críticos pagãos do Cristianismo geralmente viam a ressurreição, na melhor das hipóteses, como metempsicose [Transmigração da alma de um corpo para outro] mal entendida. Na pior das hipóteses, parecia ridículo.” Ainda deve se notar que o mundo pagão era inundado com pontos de vista associados com os que pensavam que a matéria era maligna e a raiz de todos os problemas dos homens. O pensamento Platônico, como Murray Harris diz, supunha que “o maior bem do homem consistia na emancipação da profanação corporal. A nudez da desencarnação era o estado ideal.” A ressurreição física era o último tipo de estágio para a humanidade que você gostaria de pregar.

Realmente, dentre os pagãos, a ressurreição era considerada impossível. Wright em Resurrection of the Son of God [A Ressurreição do Filho de Deus] cita o Rei Príamo, de Homero: “Lamentar-se pelo seu filho morto não trará bem nenhum. Você morrerá antes de trazê-lo de volta à vida.” E a Eumenides de Ésquilo: “Uma vez que um homem morreu, e a poeira ficou ensopada com seu sangue, não há ressurreição.” E por aí vai, com várias outras citações negando a possibilidade da ressurreição [32-3]. Wright ainda nota que a crença na ressurreição era um motivo para ser perseguido: “Não devemos nos esquecer de que quando Irineu se tornou bispo de Lyons, ele estava substituindo um bispo que morreu graças à perseguição cruel; e que um dos temas dessa perseguição era o apego tenaz dos Cristãos na crença de uma ressurreição em um corpo físico. Os detalhes do martírio são encontrados na carta das igrejas de Viena e Lyons às da Ásia e Frígia. A carta descreve como, em alguns casos, os torturadores queimavam os corpos e espalhavam as cinzas no rio Rhône, de forma que nenhum resto dos mártires ainda pudesse ser visto na terra. Eles faziam isto, diz o escritor, “como se fossem capazes de conquistar Deus, e despojarem-se do seu renascimento [palingenesia]’.”

O próprio Judaísmo teria tido sua própria dificuldade, embora menor e não insuperável: não havia a percepção da ressurreição de um indivíduo antes da ressurreição geral no dia do Juízo. Mas novamente, isto, embora estranho, poderia ter sido superado – contanto que houvesse evidências! O que não era tão fácil de se conseguir no mundo pagão. Podemos ver bem que Paulo teve de lutar contra os Gnósticos, os Platonistas, e os ascéticos sobre essas questões. Mas o que faz isto especialmente revelador é que uma ressurreição física era completamente inútil para simplesmente começar uma religião. Teria sido o bastante dizer que o corpo de Jesus foi levado aos céus, como Moisés ou Elias. E, de fato, isso teria se ajustado com o que era esperado (veja aqui), e teria sido muito mais fácil de “vender” para os Gregos e Romanos, para quem a melhor “evidência” de elevação ao ranking divino era a apoteose – o transporte da alma para os reinos celestiais após a morte; ou então a transferência quando ainda vivo. Então por que se incomodar tornando o caminho ainda mais difícil? Há somente uma resposta plausível – eles realmente tinham uma ressurreição para pregar.

FATOR 4 – O QUE HÁ DE NOVO? O QUE NÃO É BOM?

A literatura Romana nos diz que “(O) teste primário da verdade em questões religiosas era o costume e a tradição, as práticas dos antigos” (62). Em outras palavras, se suas crenças tinham o tipo certo de histórico e uma linhagem decente, você seria respeitado pelos Romanos. O velho era bom, e a inovação era ruim.

Esta foi uma grande dificuldade inicial para o Cristianismo, porque era possível rastrear suas raízes até seu fundador recente. Os Cristãos eram considerados “inovadores arrogantes” (63) cuja religião era a nova recém chegada, mas que, contudo, atrevia-se a insistir que era o único caminho! Como notado anteriormente, O Cristianismo afirmava que as pessoas no poder, que julgaram Jesus como merecedor do pior e mais vergonhoso tipo de morte, estavam totalmente erradas, e o próprio Deus disse isso.

Malina e Neyrey [164] explicam o assunto em maiores detalhes. A reverência era dada aos ancestrais, considerados mais importantes “pelo fato do nascimento”. Os Romanos “eram culturalmente compelidos a tentar efetuar a impossível tarefa de cumprir com as expectativas das tradições daqueles personagens do seu passado em comum, necessariamente mais importantes que eles.” O que havia sido passado para as gerações seguintes era “presumivelmente válido e normativo. Os argumentos poderosos poderiam ser redigidos como: ‘Nós sempre fizemos isso desta forma!’” semper, ubique, ab omnibus – “sempre, em todo lugar, por todos!” Em contraste, o Cristianismo dizia: “Não agora, não aqui, e não você!” É claro que isso explica o porquê de Paulo apelar para o que havia sido transmitido a ele por outros (1 Coríntios 11:2) – mas isto está dentro do contexto de uma igreja onde a transmissão estava ocorrendo apenas nos últimos 20 anos! Pilch e Malina adicionam (Handbook of Biblical Social Values, p. 19 – Manual de Valores Sociais Bíblicos) que a mudança ou novidades nas práticas e doutrinas religiosas deram de cara com uma reação especialmente violenta; a mudança ou novidade era “uma forma de valor que servia para inovar ou subverter valores centrais e valores secundários.”

Mesmo a escatologia e teologia Cristãs se opuseram a este tipo de percepção. A idéia da santificação, de uma purificação e aperfeiçoamento supremos do mundo e de cada pessoa, se opunha à visão de que o passado foi o melhor dos tempos e as coisas ficaram piores desde então.

Os Judeus, por outro lado, possuíam raízes bem mais antigas, e embora alguns críticos Romanos tenham feito um esforço para “desenraizar” estas raízes, outros (inclusive Tácito) concedia aos Judeus certo grau de respeito devido à antigüidade de suas crenças. Levando isto em conta, podemos entender os esforços dos escritores Cristãos em ligar o Cristianismo ao Judaísmo o máximo possível, e assim, atingir a mesma “antigüidade” que algumas vezes era garantida aos Judeus. (É claro que concordamos que os Cristãos estavam certos ao fazer isso, mas os Romanos não viam isso da mesma forma!)

Os críticos do Cristianismo, é claro, “sacaram” este “truque” e logo apontaram (embora de forma ilegítima) que os Cristãos dificilmente poderiam se dizer ligados ao Judaísmo ao mesmo tempo em que não guardavam nenhuma das práticas dessa religião Portanto, esta é uma barreira que o Cristianismo nunca pôde superar fora de um círculo restrito – não sem oferecer alguma prova sólida.

FATOR 5 – NÃO EXIJA COMPORTAMENTOS

Esta não era uma das maiores barreiras, mas era significante, e claro, ainda é hoje em dia. Eticamente, a religião Cristã é difícil de seguir. O Judaísmo também era, e este é um dos motivos de haver naquele tempo tão poucos tementes a Deus. O Cristianismo não oferecia festanças com bebedeiras ou orgias com prostitutas de templos; na verdade, as proibia. Não encorajava a fortuna; encorajava a divisão da fortuna. Não apelava aos sentidos, prometia um “rico futuro, pouco a pouco”. Isto era um problema no mundo antigo da mesma forma que é hoje em dia – senão maior naquele tempo. O Cristianismo não seria atrativo para os ricos, que seriam direcionados a compartilhar suas riquezas. Os pobres poderiam gostar disso, não gostariam se não pudessem gastar a grana compartilhada em suas distrações viciosas favoritas (das quais nem todas eram tidas como “auto-prejudiciais” e, portanto, ofereciam ainda mais motivos para abandoná-las). Novamente, esta não é uma barreira insuperável; alguns Romanos eram atraídos pelo sistema ético do Judaísmo, e, de forma semelhante, teriam sido atraídos pelo Cristianismo. Mas é muito difícil explicar por que o Cristianismo cresceu onde os tementes a Deus eram sempre um grupo muito pequeno. Nem mesmo o fervor evangelístico explica isso.

FATOR 6 – A TOLERÂNCIA É UMA VIRTUDE

Já mencionamos sobre o problema do Cristianismo ser visto como um “inovador arrogante”. Agora compliquemos mais: Não somente um inovador, mas um inovador exclusivista. Muitos céticos e descrentes de hoje em dia se dizem desinteressados devido à “arrogância” e o exclusivismo Cristãos. E quão mais no mundo antigo? Os Romanos já eram grosseiramente intolerantes (ponto 2 já visto); quão mais no contexto de outra fé muito nova jogando o mesmo jogo e alegando abolir a ordem social e religiosa? Quão mais, se uma fé que surge nos diz que devemos parar de freqüentar nossas igrejas (e na verdade, preferiria que nós as derrubássemos!), parar com as nossas festas, parar de obedecer à ordem social que já estava em vigor desde o tempo dos nossos venerados ancestrais até agora? Como DeSilva nota, “a mensagem sobre este Cristo era incompatível com a mais arraigada ideologia religiosa do mundo dos Gentios, como também com a mais recente mensagem propagada na ideologia imperial Romana” [46] (i.e., a pax Romana contra a escatologia e julgamento de Deus). Os Cristãos se recusaram a acreditar nos deuses, “os guardiões da estabilidade da ordem mundial, os patronos generosos que proviam tudo o que era preciso para a manutenção da vida, como também os concessores de pedidos individuais”. Assim como os Judeus, os Cristãos foram acusados de ateísmo sob esta regra. Além do mais, devido ao fato de que não havia aspectos da vida social que fosse secular – a religião era tão mesclada à vida pública, que faria legiões de advogados da ACLU morrerem sufocados – Os Judeus e os Cristãos se mantinham afastados da vida pública, e, portanto, causavam a indignação de seus vizinhos.

Isso já era ruim o bastante, mas os Judeus também eram intolerantes com a nova fé. As famílias de Judeus sentiriam pressão social para isolar os convertidos e evitar a vergonha da conversão deles. Sem algo para superar a intolerância dos Judeus e dos Romanos, o Cristianismo estava condenado.

FATOR 7 – ENTRANDO NA HISTÓRIA

Atos 26:26 – Eu posso falar diante do rei Agripa com toda a coragem porque tenho a certeza de que ele conhece todas essas coisas muito bem, pois não aconteceram em nenhum lugar escondido.

Este é um grande fator, multifacetado, complexo e com níveis variados de força. Digamos que: Se você quisesse começar uma nova religião, com alegações novas e ferozes, você alegaria, em qualquer lugar, ter conexões que na verdade não tem? Se eu alegasse amanhã ou mesmo daqui a 40 anos que a minha tia Nettie foi ressuscitada, por acaso eu ousaria dizer que ela foi levada a julgamento na presença do juiz do supremo tribunal federal, ou foi procurada pelo governador do meu Estado para interrogação, ou foi enterrada na tumba pertencente ao Tom Cruise? Temos freqüentemente analisado de forma individual as alegações do Cristianismo, tais como o enterro na tumba de Joe A. [José de Arimatéia :) ], mas agora vamos analisar o material que estamos lidando de forma coletiva. O NT está cheio de alegações acerca de conexões e relatos de incidentes envolvendo “pessoas famosas”. Um de nossos leitores expõe sobre Herodes Agripa: este homem foi um Rei cliente dos Romanos sobre a região em torno de Jerusalém – “foi comido por vermes” como Lucas relata em Atos 12:20-23. Havia cópias de Atos circulando na área, e eram acessíveis ao público. Se Lucas tivesse relatado de forma falsa, o Cristianismo teria sido dispensado como uma fraude, e como religião, não teria “pegado”. Se Lucas tivesse mentido em seus relatos, provavelmente teria sido preso e/ou executado pelo filho de Agripa, Herodes Agripa II (que tinha a mesma posição), porque esta era a pessoa para quem Paulo testificou em Atos 25 e 26 (relatado por Lucas). Agripa II estava vivo e no poder após Lucas ter escrito e circulado Atos; realmente, ele tinha acesso à todas as informações e alegações necessárias (Atos 26:26-27 – 26Eu posso falar diante do rei Agripa com toda a coragem porque tenho a certeza de que ele conhece todas essas coisas muito bem, pois não aconteceram em nenhum lugar escondido. 27 – Então Paulo disse ao rei: - Rei Agripa, o senhor crê nos profetas? Eu sei que crê!) Agripa executou Paulo por esses relatos? Não, e não poderia, se isso não fosse verdade. Ao invés disso, Agripa disse ao governador Festo: “Ele já podia estar solto se não tivesse pedido para ser julgado pelo Imperador” [Atos 26:32]).

O cético pode perguntar, “e daí?” E daí? Considere o efeito dominó ao se fazer tais alegações. Se a alegação #1 for provada falsa, isso abre a porta para que se duvide das outras – todo o caminho até o relato da ressurreição. E nem precisa ser a tumba de Joe A. ou Herodes virando vermeburguer. Pode ser qualquer lugar onde os primeiros Cristãos e o NT fazem alegações ousadas em relação a alguma influência ou evento em qualquer cidade. As pessoas fora da área de Lystra podem não ter sabido o bastante sobre o que aconteceu lá, ou não queriam checar, mas o Cristianismo estava fazendo alegações em pontos variados através do Império, e havia “checadores de fatos embutidos”, situados em torno do Império que poderiam dizer algo sobre todas as alegações centrais para Jerusalém e a Judéia – os Judeus da Diáspora. (E fica ainda pior; veja abaixo!)

O NT alega incontáveis pontos de toque que poderiam estar nesta lista. Um terremoto, escuridão ao meio-dia, a cortina do templo rasgada pelo meio, uma execução, tudo na Páscoa (com milhões de presentes), pessoas caindo de uma casa falando em línguas em Pentecostes (outro desses “eventos presenciados por milhões”) – Tudo isso em uma pequena cidade e em uma cultura onde as notícias se espalhariam rápido (veja abaixo). Curas de doenças e disfunções, até mesmo reversões da morte, em locais públicos. Uma entrada triunfante em Jerusalém em óbvio cumprimento de uma profecia Messiânica.

Em resumo, o Cristianismo era altamente vulnerável à inspeção e refutação em inumeráveis pontos – qualquer desses, se não tivesse tido sucesso, teria criado um efeito bola de neve em direção a mais dúvidas, especialmente levando em consideração os fatores prévios acima que poderiam ter sido motivo suficiente para qualquer Judeu ou Gentio dizer ou fazer algo. Essa não é a forma de se começar uma religião. Você começa uma religião fazendo ligações com pessoas desconhecidas e sem nome. Você não fala de um líder de uma sinagoga ou de um membro do Sinédrio, ou mesmo tem um centurião na sua história (mesmo que não se dê um nome a ele; havia poucos, de forma que não seria difícil checar quem foi). Você se apega aos sem-nomes como a mulher no poço. Houve interações com estas pessoas, claro, porém o ponto não é a presença deles, mas sim a presença dos mais notáveis e de melhor posição social, e as alegações ligadas a eles. É impossível que o Cristianismo tivesse prosperado e sobrevivido sem ter tudo “certinho” no que diz respeito a isso.

FATOR 8 – OS MÁRTIRES SÃO IMPORTANTES E MAIS?

Este é um argumento padrão, mas que precisa de uma sintonia fina. Os mártires mais importantes são os do tempo de Jesus ou de imediatamente após ele. Reconhecidamente, há alguns exemplos deste tipo de martírio que nós queremos apontar – os registros da tradição da igreja são a nossa única fonte para os martírios de muitos dos Apóstolos; nossa melhor testemunha, na verdade, é o próprio Paulo, que testifica ter perseguido a igreja com “fervor” – utilizando uma palavra utilizada para descrever as ações dos Macabeus que matavam quando precisavam fazer uma limpeza.

Mas na verdade, podemos ampliar este argumento ainda mais: a perseguição não se iguala automaticamente ao martírio, e esta é outra razão pela qual o Cristianismo não deveria ter prosperado e sobrevivido. Como escrito por Robin Lane Fox, “Ao reduzir a história da perseguição Cristã a uma história de audiências legais, perdemos uma grande parte da vitimização.” [Fox. Pagans and Christians, 424 – Pagãos e Cristãos]. Além da ação das autoridades, os Cristãos poderiam esperar o ostracismo se insistissem em permanecer na fé, e aqui é onde muito da perseguição a que Fox se refere veio – rejeição pela família e sociedade, redução ao status de banido. Não era preciso um martírio – se você sofresse socialmente e de outras formas, mesmo continuando vivo, já era o bastante. DeSilva nota que aqueles que violavam os valores sociais em vigor (como feito pelos Cristãos!), encontrar-se-iam sujeitos às medidas feitas para envergonhá-los e trazê-los de volta a conformidade – insultos, repreensão, agressões físicas, açoitamento, confisco de propriedade, e é claro, desgraça – muito mais importante em uma sociedade baseada em honra-e-desonra do que para nós. E o NT oferece um amplo registro dessas coisas acontecendo [Hebreus 10:32-34; 1 Pedro 2:12, 3:16, 4:12-16; Filipenses 1:27-30; 1 Tessalonicences 1:6, 2:13-14; 2 Tessalonicences 1:4-5; Apocalipse 2:9-10, 13].

Então é assim: Os Judeus não gostariam de você, os Romanos também não, sua família iria repudiá-lo, todo mundo iria evitá-lo ou zombar de você. Além do mais, homens como Paulo e Mateus, e mesmo Pedro e João, desistiram de negócios lucrativos pelo bem de uma missão que obviamente seria apenas problemas para eles. É muito improvável que alguém adotasse a fé Cristã em qualquer tempo – a não ser que ela tivesse algo realmente tangível por detrás.

FATOR 9 – HUMANO X DIVINO: ENCONTRO IMPOSSÍVEL!

Nosso próximo fator é relacionado a um anterior sobre a ressurreição, e é um problema tanto da perspectiva dos Judeus quanto dos Gentios. Earl Doherty, um cético, tem mencionado a incredibilidade da “idéia de que os Judeus, tanto os da Palestina quanto os espalhados pelo Império, poderiam ter crido – ou terem sido convertidos à idéia por outros – que um homem era o filho de Deus … Acreditar que Judeus comuns estariam dispostos a conceder à qualquer homem humano, não importa o quão impressionante, todos os títulos de divindade e completa identificação com o antigo Deus de Abraão é simplesmente inconcebível.” E seria mesmo: a não ser que a ressurreição tenha mesmo acontecido, e aquele “homem humano” provasse ser o filho de Deus. A “falácia” de Doherty na verdade é um argumento a favor do Cristianismo!

E não seria melhor no mundo dos Gentios. A idéia de um deus rebaixando-se à forma material, para mais do que uma visita temporal, suando, fedendo, tendo de ir ao banheiro, e especialmente, sofrendo e morrendo aqui na terra – isso seria muito pra engolir!

FATOR 10 – SEM CLASSE!

“Nem homem nem mulher, nem escravo nem livre.” Você pode estar tão acostumado a aplaudir este tipo de conceito que não percebe o quão radical esta mensagem foi para o mundo antigo. E esta é outra razão pela qual o Cristianismo deveria ter sido extinto ainda no berço, se fosse uma fraude.

Malina e Neyrey notam que no mundo antigo, as pessoas adquiriam sua identidade a partir dos vários grupos aos quais eles pertenciam. Qualquer grupo(s) ao qual eles estivessem inclusos determinava a sua identidade. As mudanças nas pessoas (como a conversão de Paulo) eram anormais. Esperava-se que cada pessoa cumprisse um determinado papel. Apagar ou manchar essas várias distinções – como no caso de Paulo, mas que na prática também aconteceu durante o ministério de Jesus – faria o Cristianismo parecer radical e ofensivo.

Note que isso não é só para os ricos e poderosos; supor que um escravo ou os pobres considerariam a mensagem do Cristianismo atraente é um anacronismo do individualismo ocidental. Em primeiro lugar, mesmo na perspectiva ocidental, juntar-se ao grupo, em termos práticos, não aliviava a condição em que estas pessoas se encontravam. Além disso, no mundo antigo, a mentalidade de não permanecer em algum tipo de relação de dependência seria estranha. “Quando os mediterrâneos antigos falavam de ‘liberdade’, eles geralmente entendiam o termo como liberdade da escravidão de um senhor ou mestre, e liberdade para passar a servir outro lorde ou benfeitor” [163]. De modo geral, também não passaria pela cabeça de tais pessoas que a situação deles poderia mudar, pois tudo o que acontecia era atribuído ao destino, sorte ou providência [189]. Você não lutava contra a situação, a coisa mais honorável era agüentá-la e resisti-la. [Daí a piada da esposa de Jó dizendo “Jó, arrume um emprego!” – Job, get a job! – é mais engraçada do que achamos!] Em outras palavras, não era uma questão de estar a serviço de outro, mas de quem você estava a serviço! Despedaçar estas distinções sociais teria sido um enorme passo em falso – a menos que você tivesse algumas cartas poderosas para jogar.

Da mesma maneira, os vizinhos Judeus de um Cristão não estariam muito felizes. A observação estrita da Torá tornou-se o único “mecanismo de defesa” contra o preconceito Romano, era a forma que eles tinham de permanecer puros contra as influências externas. Um convertido que parava de observar a Lei e começava a se associar aos Gentios receberia um tapa duplo – especialmente com memórias ainda recentes da era de Antióquio, quando os Judeus freqüentemente se rendiam ao Helenismo. Em essência, ele tinha desistido dos “banhos espirituais”!

O Cristianismo revirou as normas de ponta a cabeça, e dizia que o nascimento, etnia, sexo e riqueza – o que determinava a honra de uma pessoa neste contexto – significavam nada. Mesmo sinais menores de honra como a aparência e o carisma eram desprezados (2 Coríntios 5:12).

O fator identidade de grupo constitui-se em outra prova para a autenticidade do Cristianismo. Em uma sociedade grupalmente orientada, você pegava sua identidade do líder do seu grupo, e as pessoas precisavam do apoio e endosso de outros para apoiar sua identidade. O Cristianismo forçava um corte nos laços sociais e religiosos, as coisas que faziam a posição “humana” de uma pessoa. (Em troca, o Cristianismo propiciava seu próprio apoio comunitário, mas isso dificilmente explica o porquê das pessoas se tornarem Cristãs!) Além do mais, uma pessoa como Jesus poderia não ter mantido um ministério, a não ser que aqueles em volta dele o apoiassem. Um Jesus meramente humano não poderia ter cumprido esta demanda e deve ter propiciado provas convincentes de seu poder e autoridade para manter um grupo de seguidores, e para ter mantido um movimento que começou e sobreviveu muito tempo após sua morte. Um Jesus meramente humano teria de viver de acordo com as expectativas dos outros e teria sido abandonado, ou pelo menos teria de mudar de cavalo no primeiro sinal de fracasso.

FATOR 11 – NÃO CONFIE EM MULHERES!

Este tem sido mencionado muitas vezes, mas isso o torna mais bem elaborado. Se o Cristianismo quisesse ter sucesso, nunca deveria ter admitido que as mulheres fossem as primeiras a descobrir o túmulo vazio ou as primeiras a verem Jesus ressuscitado. Também nunca deveria ter admitido que as mulheres fossem as principais apoiadoras (Lucas 8:3) ou as convertidas principais (Atos 16).

Muitos têm apontado que as mulheres eram consideradas como “más testemunhas” no mundo antigo. Precisamos enfatizar que isto não era uma peculiaridade como seria hoje em dia, mas um estereótipo inerente. Malina e Neyrey notam que, na antigüidade, o sexo vinha carregado de “estereótipos elaborados do que seria um comportamento apropriado para os homens e mulheres” [72]. Quintílio disse a respeito dos assassinatos, que os machos são mais propensos a cometê-los em roubos, enquanto as fêmeas eram mais propensas ao envenenamento. Consideramos tais opiniões absurdas e politicamente incorretas hoje em dia – mas se elas são ou não, eram indelevelmente inerentes à mente antiga. “Em geral, as cortes Gregas e Romanas excluíam como testemunhas as mulheres, escravos e crianças … de acordo com Josefo … [as mulheres] eram inaceitáveis devido à ‘leviandade e ousadia do seu sexo’” [82]. As mulheres eram tão pouco confiáveis que nem mesmo eram permitidas como testemunhas do nascer da lua como um sinal do início de festivais! DeSilva também nota [33] que uma mulher e suas palavras não eram consideradas como “propriedade pública”, mas sim eram protegidas dos estranhos – esperava-se que as mulheres falassem preferencialmente com seus maridos. O lugar de uma mulher era em casa, não no palanque das testemunhas, e qualquer mulher que testemunhasse de forma independente estaria violando o código de honra.

Teria sido muito mais fácil atribuir a descoberta do túmulo aos discípulos homens (como parece ter sido enfatizado, baseado no credo em 1 Coríntios 15, embora isto sirva ao propósito distinto de estabelecer que a liderança da igreja foi testemunha do Cristo ressuscitado, e não uma evasão acerca de mulheres terem sido testemunhas), ou que alguém como Cléopas ou mesmo Nicodemos tivessem encontrado o túmulo primeiro, ou mediar o testemunho através de Pedro ou João. Mas aparentemente eles estavam apoiados nisso – e também aparentemente superaram mais um estigma.

FATOR 12 – TAMBÉM NÃO CONFIE EM CAIPIRAS!

Mas antes de você se unir AGORA, temos mais. O problema não era só com as mulheres. Pedro e João foram dispensados com base em suas posições sociais (Atos 4:13) e isto reflete um ponto de vista muito comum dos antigos. Já notamos o problema de Jesus ser procedente da Galiléia e Nazaré. Isto também era um problema para os discípulos – e poderia ter atrapalhado a pregação deles. Os próprios Judeus não confiavam em tais pessoas, se devemos acreditar em um testemunho posterior, no Talmude, sobre homens como Pedro e João, chamados “povo do campo”, era dito: “…não confiamos no testemunho deles; não aceitamos o testemunho deles.” Embora este seja um relato posterior, representa um antigo truísmo também aplicável no mundo antigo como um todo. A posição social era intimamente ligada ao caráter da pessoa. Justo ou não, um caipira era a última pessoa em que você acreditaria. Entre o bando de apóstolos, somente Paulo pode ter evitado este estigma. (Mateus também poderia, se ele não fosse membro de um grupo desprezado por razões distintas: Um coletor de impostos!) Muitos poucos mensageiros do Cristianismo teriam sido capazes de evitar este estigma.

Há outra dificuldade neste fator: O Cristianismo não tinha nenhuma das “cartas do poder”. Ele não era apoiado pela “estrutura de poder” daqueles dias, nem Romana nem Judaica. Se necessário, ele poderia ter sido esmagado meramente pela autoridade. Por que ele não foi, visto que era tão propenso a se envolver nos negócios alheios? Você acha que ninguém se importaria? Não esteja tão certo:

FATOR 13 – VOCÊ NÃO PODE GUARDAR SEGREDO!

A cultura grupo-orientada dos antigos reforça ainda mais outro argumento apologético comum. Os apologistas regularmente notam que as alegações dos Cristãos poderiam ter sido facilmente checadas e verificadas. Os céticos, especialmente G.A. Wells, reagem supondo que ninguém teria se importado em descobrir essas coisas. Os céticos estão errados – eles operam não somente contra a tendência natural humana à curiosidade, mas também contra uma estrutura social muito importante e grupo-orientada.

Você dá valor à sua privacidade? Então permaneça nos EUA. Malina e Neyrey notam que “em culturas grupo-orientadas como as do antigo Mediterrâneo, devemos nos lembrar que as pessoas continuamente se metiam nos negócios alheios” [183]. A privacidade era desconhecida e inesperada. Por um lado, os vizinhos manifestavam uma “vigilância constante” sobre os outros; por outro lado, os vigiados estavam sempre preocupados com as aparências, e as recompensas honoráveis ou as sanções humilhantes associadas que vinham com os resultados. É a mesma coisa em culturas grupo-orientadas hoje em dia … se você já imaginou porquê temos dificuldades em espalhar a “democracia”, você não precisa procurar mais, 70% do mundo é grupo-orientado.

Pense nisso: Nós reclamamos da erosão da privacidade, mas saiba também que isto é um acordo pelo bem do controle social. Os antigos não teriam se preocupado sobre não ter medidas adequadas preparadas para deter um ataque terrorista – porque tais medidas de vigilância já estavam presentes. O controle não vem de indivíduos se controlando, mas sim do grupo controlando o indivíduo. (Este também é o motivo de nós termos dificuldade em relação às antigas formas de companheirismo da igreja!) Pilch e Malina [115] adicionam que no mundo antigo, os estranhos eram vistos como se apresentassem uma ameaça a comunidade, porque “eles são potencialmente qualquer coisa que alguém queira imaginar … Daí, eles devem ser checados sobre se poderão se adaptar e sobre se irão aceitar as normas da comunidade.” Malina adiciona em The New Testament World [O mundo do Novo Testamento] [36-7] que sempre se presumia que a honra existisse dentro do próprio sangue da família, mas que tudo fora daquele círculo era “presumido que fosse desonroso – não confiável, por assim dizer – a menos que se provasse o contrário.” Não se confia em ninguém de fora da família “a menos que a confiança possa ser validada e verificada.” Os estranhos em uma vila são considerados “inimigos em potencial”; os estrangeiros “de passagem” (como os missionários) são “considerados como inimigos na certa”. Os missionários teriam suas virtudes testadas a cada novo ponto em que paravam!

As pessoas do mundo antigo controlavam os comportamentos dos outros ao observá-los, espalhar coisas sobre eles para os outros (o que nós chamamos “fofoca”), e por desonra pública. Os críticos que perguntam o que os Fariseus estavam fazendo no campo observando os discípulos de Jesus colhendo espigas de milho, e consideram isso improvável, estão muito por fora. “…[O]s Fariseus pareciam se importar com os negócios de Jesus todo o tempo,” [183] e isso não é grande coisa, pois era o normal a se fazer. (Philo nota que havia “milhares” que mantinham seus olhos nos outros, no seu zelo em assegurar que eles não subvertessem as instituições ancestrais Judaicas – Wright, Jesus and the Victory of God [Jesus e a Vitória de Deus], 379.)

Então tem-se outro enigma para o cético. Em uma sociedade onde nada escapava sem ser notado, realmente havia todas as razões para se supor que as pessoas que ouvissem a mensagem do Evangelho iriam checar os fatos – especialmente quando se tratava de um movimento com uma mensagem radical como o Cristianismo. O túmulo vazio seria checado. A história de Mateus sobre a ressurreição dos santos seria checada. Procurar-se-ia Lázaro para se fazer questões. As alegações excessivas de honra, como as que Jesus tinha sido vindicado, ou suas alegações de divindade, teriam sido analisadas de forma detalhada. Checar os fatos propiciaria “grãos para o moinho” [argumentos para refutar o movimento] (visto que se assumiria que isso poderia ajudar a controlar o movimento). Se os Fariseus checaram Jesus em coisas como lavar as mãos e colher grãos; se grandes multidões se reuniram em torno de Jesus a cada vez que ele espirrava – quanto mais, as coisas como uma alegação de ressurreição seriam analisadas!

FATOR 14 – UMA DIVINDADE IGNORANTE?

Estudiosos de todas as vertentes há muito tempo reconheceram o “critério do embaraço” como um marcador para a autenticidade das palavras de Jesus. Os locais onde Jesus alega ser ignorante (não saber o dia e a hora de seu retorno; não saber quem o tocou no meio da multidão) ou mostra fraqueza são tomados como recordações honestas e autênticas (mesmo quando as histórias dos milagres freqüentemente não são!). Este é um primo menor do fator crucificação já visto – se você quer uma divindade decente, tem de fazê-lo completamente respeitável. A ignorância sobre o futuro ou eventos presentes pintam um quadro forte que as explicações teológicas sobre o esvaziamento kenótico não iriam superar a curto prazo. Você tem de ter um trunfo para superar esta “jogada”; caso contrário, críticos como Celso teriam mais pontos para argumentar.

FATOR 15 – UM PROFETA SEM HONRA

Marcos 6:4 – Mas Jesus disse: - Um profeta é respeitado em toda parte, menos na sua terra, entre os seus parentes e na sua própria casa.

Já notamos acima que Jesus morreu de forma desonrosa, e veio de um local com baixo “índice de honra”. Há mais sobre esta questão da desonra, mas para não parecer que estamos “arrumando o baralho” em nosso favor, vejamos alguns outros locais onde Jesus suportou a desgraça – e, portanto, também ofendeu as sensibilidades dos seus contemporâneos:

* A zombaria antes da sua execução – isto não era um mero jogo de enfeite, mas um insulto calculado à honra de Jesus e à sua alegação de ser o Rei dos Judeus. Fazer isso, e desafiar Jesus a profetizar, era uma forma de se desafiar e negar a honra dele. De acordo com o pensamento de uma sociedade baseada na honra, Jesus deveria ter aceitado o desafio e mostrado ser um profeta ou rei.

* As acusações – superficialmente, Jesus cometeu blasfêmia abertamente e confessou ser culpado do crime de sedição. “Aqueles eleitos para seguir um homem subversivo e desgraçado eram imediatamente suspeitos aos olhos [dos Judeus e Romanos]” [DeSilva, 46].

* O enterro – Byron McCane escreveu um artigo, The Shame of Jesus’ Burial [A Vergonha do Enterro de Jesus], no qual ele argumenta que José de Arimatéia tinha outros motivos, além de ser um discípulo de Jesus, para organizar o enterro: Preencher o requerimento de Deuteronômio 21:22-23 e enterrar um homem pendurado em um madeiro antes do por do sol. Como membro do Sinédrio, José teria esta preocupação e faria os preparos. Por outro lado, o fato de Jesus ter sido enterrado no túmulo de José – e não em um túmulo pertencente à sua própria família – era por si só desonroso. A falta de pessoas de luto também foi uma grande desonra.Seria justo notar que McCane não considera tudo o que está nos Evangelhos como confiável. Ele indica também que José não era realmente um discípulo de Jesus, era apenas um membro do Sinédrio fazendo seu trabalho. Talvez não tivesse passado pela cabeça de McCane supor que José usou seu dever como pretexto para conseguir o corpo de Jesus, antes que algum outro membro do Sinédrio com menos respeito por ele o fizesse. Mas em todo caso, mesmo com os relatos dos Evangelhos considerados completamente precisos, eles “ainda apresentam um enterro no qual um Judeu na Palestina Romana seria reconhecido como desonrado.”

FATOR 16 – MISCELÂNEA DE CONTRÁRIOS

Nesta seção iremos colocar várias notas sobre os ensinamentos e atitudes de Jesus e do Cristianismo primitivo contrários ao que era aceito como normal no Século I. Alguns destes, de certa forma, irão se sobrepor aos fatores anteriores (especialmente o #4, novidade). Devido ao fato desta seção ter sido adicionada depois das anteriores, não há paralelos com ela nos três ensaios sobre “outras religiões” a serem indicados posteriormente.

Dos comentários Social-Science Commentary on the Synoptic Gospels [Comentário Sociológico Sobre os Evangelhos Sinóticos] e o [Comentário Sociológico] de João , de Malina e Rohrbaugh:

* Jesus ensinou às pessoas que, se preciso, rompessem até mesmo com a família pelo bem do Reino; ele também indicou uma comunidade altamente inclusiva (Mateus 8:11-12) em uma sociedade altamente inclusiva. O próprio Cristianismo, como já vimos, tinha crenças que poderiam ter alienado as pessoas. Valeria a pena? “Dada a aguda estratificação social prevalecente na antigüidade, aqueles que se envolviam em relações sociais impróprias [Nota do autor: Misturas de escravos e pessoas livres, ricos e pobres, etc.!] arriscavam ser cortados de todas as redes de relacionamentos das quais suas posições dependiam. Em sociedades tradicionais isso era levado muito à sério. A alienação da família ou do clã poderia literalmente ser uma questão de vida ou morte, especialmente para a elite [Nota do autor: O Cristianismo teve mais que o número habitual nesta área!], que iria arriscar tudo pelo tipo errado de associação com o tipo errado de pessoas. Visto que as inclusivas comunidades Cristãs exigiam exatamente este tipo de associação ao longo das linhas de status de parentesco, a situação apresentada aqui [Mateus 10:34-36] é mesmo realística. A alienação iria até mesmo se espalhar além da família de origem para a rede de parentesco formada pelo casamento…” [92]. A “associação” incluía ser visto comendo com pessoas de baixa posição social [135]. “Tal despedida da família era algo moralmente impossível em uma sociedade onde a unidade de parentesco era a instituição social local” [244].

* De forma relacionada, deixar a família geralmente significava abandonar bens materiais, de acordo com a demanda de Jesus ao jovem rico (Lucas 18:18-30). Isto também é um problema: “A mobilidade geográfica e a conseqüente quebra da rede de relacionamentos sociais (família biológica, patronos, amigos, vizinhos) era considerada um comportamento seriamente desviado e teria sido muito mais traumático na antigüidade do que simplesmente deixar riquezas materiais para trás” [313]. Agora relacione isso com Pedro e Cia. Deixando tudo para trás!

* Em seus ensinamentos Jesus freqüentemente fazia inversões das expectativas comuns que teriam ofendido a maioria de forma grosseira. A parábola do “Bom Samaritano” é um exemplo – todos nós sabemos que os Samaritanos eram um povo desprezado; isso teria sido suficientemente ofensivo! Mas poucos percebem que a vítima também foi esboçada como alguém amplamente odiado: A vítima, assim como o Samaritano, eram comerciantes. Os comerciantes freqüentemente enriqueciam às custas dos outros, e eram desprezados pelas massas, que os viam como ladrões e, na verdade, teriam simpatizado com os bandidos que os roubaram! Jesus inverteu completamente os estereótipos (ver o item 2 acima) de forma que teria chocado a maioria de seus ouvintes [347]. (Sem falar no fato de que ele estendeu a categoria de “vizinho” a essas pessoas!)

* Uma inversão similar: o convite e a aceitação de Zaqueu (Lucas 19). Ao jantar com o Zaca, Jesus demonstrou companheirismo com alguém que compartilhava seus bens. A multidão ficou consternada, pois os cobradores de impostos eram estereotipados como “extorquidores vorazes”. O pronunciamento de Zaqueu, freqüentemente entendido como significando que ele iria, a partir daquele momento, ressarcir o que tinha roubado, na verdade significa que ele já vinha ressarcindo todos os que ele descobria que havia trapaceado (mesmo antes de conhecer Jesus!) e o companheirismo de Jesus é, portanto, entendido como se estivesse dizendo, “eu acredito nele” – enquanto a multidão não [387]. (É claro que isto também se aplicava a Mateus.)

* Nós podemos não dar muita importância a Maria sentando aos pés de Jesus enquanto Marta fazia o trabalho doméstico; podemos até mesmo simpatizar, mas os antigos não. Pois a reputação de uma mulher dependia de sua habilidade em administrar os trabalhos domésticos, a reclamação de Marta pareceria legítima – e Maria, por ter sentado e escutado, ao invés de ajudado a irmã, estava “agindo como um homem!” [348]. Este exemplo teria sido chocante para os antigos. De forma semelhante foi o encontro de Jesus com a mulher Samaritana [Comentário de João, pp. 98-9] – falando com ela em público (uma desviada social) e usando o mesmo utensílio para beber água. Isto teria ofendido as visões comuns sobre a pureza e as relações intra- e extra-grupais.

* O tema “nascer de novo” era chocante! [João, 82] O status de honra era considerado fixo no nascimento. Somente as circunstâncias extraordinárias permitiriam uma mudança neste status. Nascer de novo significaria a mudança no status da honra de forma fundamental, “um evento de mudança de vida, de proporções incríveis”. Pregar um “novo nascimento” teria sido inconcebível!

Do livro de N. T. Wright, Jesus and the Victory of God [Jesus e a Vitória de Deus][369-442]:

Tocar em símbolos apreciados pode ser um risco e meio! Pense em como as pessoas reagem quando alguém queima a bandeira dos EUA – e agora aplique isso a algumas das coisas que Jesus fez que “de forma implícita e explícita atacaram o que havia se tornado símbolo padrão da visão de mundo dos Judeus do Segundo Templo”, e por meio disso subverteu o etos único Judeu que era entendido como aquilo que dava a Israel a sua identidade única:

* A atitude única geral em relação aos poderes pagãos como Roma era a revolução. Mas ao invés disso, Jesus aconselhou a “dar a outra face” e carregar a carga do soldado uma milha a mais. A divergência é como a de Malcolm X versus Martin Luther king, num tempo em que os métodos de Malcolm eram altamente favorecidos.

* Guardar o Shabat de forma estrita era uma distinção dos Judeus; as atividades de Jesus, de cura e colher de milho no Shabat não violaram a Lei propriamente dita, mas sim a interpretação rigorosa favorecida pelos que desejavam preservar e enfatizar esta distinção. (Veja um item relacionado aqui.)
* Jesus ter renunciado ao ritual de lavar as mãos (que como a observância “persistente” do Shabá, não era uma regra da Lei, mas sim uma interpretação rigorosa dela) violou as percepções de pureza.
* Jesus ter comandado os outros a seguirem-no, ao invés de enterrar os mortos, violou uma das sensibilidades mais arraigadas do tempo, cuidar da família e atender às suas necessidades funerárias (importante tanto no contexto Judeu quanto no não-Judeu).
* A manifestação de Jesus no Templo foi um uma “representação” simbólica da destruição do que, para muitos Judeus, era o símbolo central do Judaísmo: o lugar onde o sacrifício e o perdão de pecados eram efetuados; um lugar de grande prestígio e honra perante os não-Judeus; o símbolo político central de Israel. Nem todos os Judeus concordavam com essa avaliação (os Essênios, por exemplo, consideravam o aparato do Templo como corrupto e provavelmente teriam simpatizado com Jesus aqui), mas Jesus dizer que ele seria destruído, e por pagãos, teria sido profundamente ofensivo para muitos Judeus, especialmente para os que consideravam o Templo como uma segurança contra a invasão pagã.

Também de Wright, The Resurrection of the son of God [A Ressurreição do filho de Deus], temos estas observações, oferecidas por um leitor, com suas próprias observações:

“Precisamente com base nos textos chave de Salmos, Isaías, Daniel e outros, os primeiros Cristãos declararam que Jesus era o Senhor, de tal forma a implicar, por diversas vezes, que César não era … O tema é forte em Paulo, embora grandemente ignorado até recentemente. Romanos 1:3-5 declara o ‘evangelho’ de que Jesus é o real e poderoso ‘filho de Deus’ a quem o mundo deve lealdade; Romanos 1:16-17 declara que neste ‘evangelho’ devem ser encontradas soteria e dikaiosune. Todos os elementos nesta fórmula dupla ecoa e faz paródia com coisas que eram ditas na ideologia imperial, e o culto imperial emergente no tempo. Na outra extremidade da exposição teológica da carta (15:12), Paulo cita Isaías 11:10: O Messias Davídico é o verdadeiro Senhor do mundo, e nele as nações terão esperanças” (pp 568-569).

Wright continua a listar outras passagens Paulinas como Filipenses 2:6-11, 1 Coríntios 15:20-28, e Tessalonicenses 4:15-17 que fala de Jesus de maneira a fazer paralelos com César. Ele também nota:

“E isso não está confinado em Paulo. O Jesus Ressuscitado de Mateus declara que toda a autoridade nos Céus e na Terra é agora dada a ele.”

Também,

“O evangelho de Jesus como rei dos Judeus é posto, por implicação, em tensão com o reinado de Herodes como rei dos Judeus, até a morte súbita de Herodes no capítulo 12 [de Atos]; a partir daí, o evangelho de Jesus como Senhor do mundo é posto em tensão com o reinado de César como senhor do mundo, uma tensão que vem a tona em [Atos] 17:7 e permanece latente na declaração sugestiva, mas poderosa, na passagem de fechamento, com Paulo em Roma falando do Reino do Deus verdadeiro e a Soberania do próprio Jesus … Toda esta linha de pensamento, do Reino do Deus de Israel inaugurado pela Soberania de Jesus e agora confrontando os reinos do mundo com um chamado rival por lealdade, encontra a expressão clássica um Século depois de Paulo, na famosa e deliberadamente subversiva declaração de Policarpo: ‘Como eu posso blasfemar contra o rei que me salvou?’ César era o rei, o salvador, e seu ‘caráter’ exigia um juramento; Policarpo declarou que chamar César dessas coisas seria cometer blasfêmia contra o verdadeiro rei divino e salvador” (pp. 569-570).

Wright nota, através de passagens como Romanos 13:1-7, que os Cristãos eram comandados a respeitar as autoridades governamentais. Entretanto, ele continua dizendo:

“Nossa forma particular, ocidental e moderna de expor estes assuntos, implicando que alguém deve ser ou um revolucionário ou um conservador concessor, tornou mais difícil, e não mais fácil, para chegarmos a uma compreensão histórica de como os primeiros Cristãos viam o assunto. O comando para respeitar as autoridades não corta o nervo do desafio político do Evangelho. Não significa que a ‘Soberania’ de Jesus é reduzida a uma questão puramente ‘espiritual’. Se esse fosse o caso, as grandes perseguições dos primeiros três Séculos poderiam ter sido grandemente evitadas. Este, como vimos no capítulo anterior, foi o caminho percorrido pelo gnosticismo” (p. 570).

Então a questão a se perguntar é: “Por que os primeiros Cristãos mantêm uma resistência política tão ousada como parte de seu sistema de crenças estabelecido?” Eles devem ter realmente acreditado que Jesus era o Senhor deste mundo, e que sua ressurreição provou isso. Wright conclui:

“Esta crença subversiva na Soberania de Jesus, superior ou contrária àquela de César, foi mantida, contrariando o fato de que César tinha demonstrado seu poder superior de forma óbvia, crucificando Jesus. Mas a coisa realmente extraordinária é que esta crença era mantida por um grupo pequeno que, pelo menos pelas primeiras duas ou terceiras gerações dificilmente poderia ter organizado um tumulto em uma vila, muito menos uma revolução em um império. Contudo, eles persistiram contra todas as dificuldades, atraindo a atenção indesejada das autoridades devido ao poder da mensagem, e a visão de mundo e o estilo de vida que ela gerava e mantinha. E sempre que voltamos aos textos chave que evidenciam o motivo de eles terem persistido em uma crença tão improvável e perigosa, a resposta era: Porque Jesus de Nazaré ressuscitou. E isto nos incita a perguntar mais uma vez: Por que eles alegavam isso?” (p. 570).

Um paralelo interessante com os tempos modernos pode ser encontrado aqui.

FATOR 17 – ENCORAJANDO AS PESSOAS A CHECAR OS FATOS

Um leitor (que usa o nome de tela “Jezz” no site TWeb) sugeriu este novo ponto. Encorajar as pessoas a verificar as alegações e buscarem provas (e, por conseguinte, desencorajar a credulidade inocente) é uma forma garantida de ser surrado, se você está pregando mentiras. Vamos supor por um minuto que você esteja tentando começar uma religião falsa. A fim de apoiar sua falsa religião, você decide inventar um número de alegações históricas (i.e., testáveis), e então espera que ninguém vá checá-las. Em outras palavras, apesar dos conselhos dados nos fatores #7 (i.e., não invente alegações históricas) e #13 (i.e., que as pessoas irão checar suas alegações), você decidiu apostar e esperar que as pessoas sejam inocentes o bastante para se unir à sua religião. Qual é a coisa mais importante a se fazer, se você inventou alegações que são provavelmente falsas? Bem, é claro, você não sai por aí encorajando as pessoas a checarem suas alegações, sabendo que se eles fizerem isso, você será desbancado!

Suponha, por exemplo, que você esteja iniciando um novo culto sobre OVNIS, em que os fiéis serão levados para dentro de um disco voador que os está aguardando. Um cultista como este iria normalmente seguir o conselho dado no fator #7, e se certificar de que o disco voador está em algum lugar onde as pessoas não podem checar (e.g., afirmar que o disco está escondido atrás da lua). Mas suponha que você ignorou este conselho, e ao invés disso, afirmou que o disco estava esperando em uma caverna em uma montanha próxima a cidade. A última coisa que você faria é encorajar as pessoas a irem até a caverna e checar sua alegação – e desta forma desencorajar a credulidade inocente, da qual a sobrevivência do seu culto depende. Se você quisesse atrair as pessoas a se juntarem ao seu culto, você teria de fazer o exato oposto – desencorajar seus recrutas em potencial a checar os fatos (talvez ao acrescentar uma cláusula, “se alguém for atrás da caverna antes da hora, este não será levado pelo disco”).

Ao longo do NT, os apóstolos encorajavam as pessoas a checarem e buscarem provas e verificar os fatos:

1 Tessalonicenses 5:21 – Examinem tudo, fiquem com o que é bom.

E quando os novos convertidos prestavam atenção a este conselho, não somente eles permaneciam convertidos (sugerindo que as evidências suportavam aos exames detalhados), mas os Apóstolos descreveram-nos como “nobres” por fazer isso:

Atos 17:11 – As pessoas dali eram mais bem educadas do que as de Tessalônica e ouviam a mensagem com muito interesse. Todos os dias estudavam as Escrituras Sagradas para saber se o que Paulo dizia era mesmo verdade.

Como se os Apóstolos já não estivessem tornando as coisas bastante difíceis para eles mesmos, ao fazerem alegações extraordinárias e testáveis em um ambiente social onde era difícil guardar segredos, eles aumentaram significativamente as adversidades ao encorajar as pessoas de forma ativa a checarem se o que eles diziam era verdade. Encorajar as pessoas a verificar alegações e buscar provas é uma forma garantida de assegurar que seu novo culto é um fracasso – a menos, é claro, que aquelas alegações suportassem os exames detalhados que seu encorajamento iria, sem dúvidas, gerar.

Podemos adicionar mais fatores posteriormente, mas por enquanto, temos o bastante para apresentar nosso desafio central. O Cristianismo, como podemos ver, tinha todas as desvantagens possíveis como uma fé. Como eu notei recentemente, algumas religiões prosperam por serem vagas (Rastafarianismo) ou por terem somente demandas filosóficas, ou demandas além da verificação (Budismo e Hinduísmo). Outras asseguram seu direito à sobrevivência mantendo-se isoladas (Mormonismo) ou pela espada (Islamismo). O Cristianismo não fez nenhuma dessas coisas e não teve nenhum destes benefícios, fora um flerte tardio com a espada quando já era uma fé fortalecida e estava sendo utilizada com propósitos políticos, como realmente qualquer religião poderia ser – e não como forma de se espalhar o Evangelho. Todas as desvantagens, e nenhuma das vantagens.Vimos que a ignorância e apatia não servem como explicações adequadas. As alegações do Cristianismo não eram muito difíceis de compreender, e de qualquer forma, o que o Cristianismo tinha a oferecer não atrairia o ignorante – caso contrário seria balanceado pelas muitas coisas que teriam despertado a desconfiança e suspeita no ignorante. A apatia, no que diz respeito às questões sociais, é um produto do nosso tempo, não do mundo antigo. Os céticos não podem apelar de forma presunçosa para estas explicações.

Me disseram que um crítico sugeriu de forma desesperada que um ou mais desses fatores não pode ser aplicado todas as vezes e à todas as pessoas neste contexto. Esta é uma resposta absurda – os fatores são centrados em valores e julgamentos inerentes ao período, costumes sociais que não são ligados e desligados como um interruptor. O crítico teria de provar que houve uma calmaria temporária em um número suficiente de fatores (mesmo para um ou dois desses que são mais do que o bastante para tirar as pessoas da nova fé) para o Cristianismo conseguir convertidos – e então documentar e explicar a calmaria, e por que ela aparentemente foi revertida depois. O ponto principal é que tal explicação é uma opinião desesperada.

Finalmente, o crítico faz confusão com o fato de que – como já observado por Stark e Meeks – O Cristianismo, como um movimento, era desequilibrado na área do status social. Visto que 99 % das pessoas eram pobres e/ou miseráveis, é claro que qualquer movimento pegaria a maioria das pessoas deste grupo, mas o Cristianismo, para o seu tamanho, tinha um número incomum de ricos e poderosos. Como Witherington nota, citando E. A. Judge (Paul Quest [A Busca de Paulo], 94):

…Os Cristãos eram dominados por uma parte socialmente pretensiosa da população das grandes cidades. Além disso, eles pareciam ter sido retirados de um grupo amplo, provavelmente representando os parentes dependentes de membros proeminentes.

Estas são as pessoas que seriam mais afetadas por estes fatores e os que menos provavelmente acreditariam; eles eram os que tinham mais a perder e menos a ganhar (de forma palpável) ao se converterem. Rodney Stark mostrou em The Rise of Christianity [A Ascensão do Cristianismo] o porquê de o movimento ter continuado a crescer a partir do momento em que se estabeleceu, mas não aborda como ele conseguiu se estabelecer em primeiro lugar. Então, como isso aconteceu?

Eu proponho que só há uma explicação abrangente para o Cristianismo ter superado estas desvantagens intoleráveis, é porque ele tinha a refutação máxima – o testemunho seguro, confiável e incontestável da ressurreição de Jesus, o único evento que, aos olhos dos antigos teria justificado a honra dele e superado os numerosos estigmas de sua morte e vida. O Cristianismo tinha uma certeza que não poderia ser negada; em outras palavras, um número suficiente de testemunhas antigas (por volta de 500!) com testemunhos sólidos e indisputáveis (nada como “a visão de Jesus no céu”, mas sim uma certeza tangível de um corpo fisicamente ressuscitado) e vários convertidos logo após o fato (os milhares em Pentecostes) que fizeram desacreditar mais difícil do que acreditar. Os céticos e críticos devem explicar por que, apesar de todos estes fatores, o Cristianismo sobreviveu e prosperou. O único candidato razoável é um testemunho consistente, forte o bastante para passar até o Século II, apesar destes fatores. Os céticos tem de achar uma desculpa melhor do que “eles eram apenas estúpidos”!

Nenhum comentário:

Postar um comentário